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Calote em precatórios afeta a economia do País

Marco Antonio Innocenti*

09 de março de 2021 | 14h50

Com o pretexto de obter recursos para combater os efeitos econômicos da crise gerada pela pandemia de Covid-19, a chamada PEC Emergencial (PEC 186/2019), cuja votação na Câmara dos Deputados está prevista para esta quarta (10/3), contém duas medidas relacionadas ao pagamento de precatórios que, na prática, representam mais um calote no pagamento desses títulos. Ao contrário do pretendido pelo governo, os efeitos da aprovação dessas propostas são extremamente nocivos para a economia e representam um retrocesso para o país.

A proposta adia por mais cinco anos — de 2024 para 2029 — o prazo para que Estados e Municípios liquidem suas dívidas com precatórios atrasados e revoga dispositivo da Constituição que obriga o governo a abrir linhas de crédito para os entes devedores. Esse tipo de medida já foi considerado inconstitucional pelo STF (Supremo Tribunal Federal), ao julgar a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 4.357. Isso, por si só, deveria bastar para encerrar o assunto, mas existem, ainda, muitas outras implicações negativas de suspender o pagamento dos precatórios.

Além de ser uma forma ineficiente de fazer política fiscal, deveria causar, no mínimo, espanto que o governo proponha resolver um problema deixando de cumprir seus compromissos. A reação negativa que os mercados exibiram no ano passado à ideia da suspensão dos pagamentos dos precatórios parece não ter sido suficiente para que os atuais governantes compreendam a gravidade da situação.

Não bastasse o prejuízo à credibilidade do país, o adiamento do pagamento dos precatórios e a eliminação das linhas de financiamento da União para Estados e Municípios têm efeitos deletérios para a economia, exatamente o oposto do que o governo busca.

O precatório é uma dívida cara, reajustada pela inflação (IPCA-e) e sobre o qual incidem juros e multas quando não é quitado no prazo previsto. Quanto mais o tempo passa, maior a participação dos juros no valor total a ser pago. Um estudo inédito da FGV (Fundação Getúlio Vargas) sobre o tema mostrou que, passados dez anos após a sua emissão, os juros representam, em média, 37% do valor total de um precatório. Assim, adiar o seu pagamento é só aumentar o problema. Agora estão querendo adiar por cinco anos pelo menos.

Um dos caminhos para fazer uma gestão mais eficiente dessa dívida seria justamente emitir títulos públicos para financiar o pagamento. Os juros oferecidos pelo governo aos investidores são menores do que os que incidem sobre os precatórios, o que permite trocar uma dívida cara por outra mais barata.

Como os Estados e Municípios não podem emitir dívida, a União teria que financiá-los, ainda que parcialmente, para que consigam manter o pagamento dos precatórios. Esse caminho geraria um benefício duplo: a redução das despesas com juros e o estímulo à economia graças à injeção de recursos advindos da antecipação da quitação desses títulos.

Somados, Estados e Municípios devem R$ 104 bilhões em precatórios. Em alguns casos, como no Distrito Federal, os precatórios representam quase metade da dívida consolidada. Uma suspensão dos pagamentos dos precatórios teria o efeito de bola de neve, aumentando essa dívida e, consequentemente, a dívida pública como um todo.

O estudo da FGV destaca, no entanto, que dívida alta reduz o crescimento econômico em países de renda média e baixa, como é o caso do Brasil. O alto endividamento gera insegurança institucional, uma vez que os investidores começam a questionar a capacidade do governo de honrar seus compromissos. Não é sem razão, como estamos vendo aqui.

Isso afasta o capital estrangeiro e aumenta o prêmio de risco exigido para a prestação de serviços públicos e investimentos no país. Em outras palavras, menos investimentos, menos consumo e taxas de juros mais altas.

O não pagamento dos precatórios também tem um impacto social, especialmente em tempos de pandemia, dado que boa parte deles é de natureza alimentar (decorrentes de condenação ao pagamento de diferenças de vencimentos, proventos e pensões, de indenização por acidente do trabalho ou por morte ou invalidez). Muitos desses credores aguardaram o processo tramitar na Justiça durante anos ou décadas e agora já são idosos. Para essas pessoas, esse pagamento tem impacto na renda e, consequentemente, no consumo.

Por isso, no limite, como mostra o estudo da FGV, a postergação do prazo para o pagamento dos precatórios contribui para aumentar a dívida pública e, ao mesmo tempo, reduzir o consumo. Dessa forma, pode estar associada a uma redução do crescimento econômico e a um aumento no desemprego.

Além da emissão de dívida por parte da União, existem diversas vias para uma gestão mais eficiente dos precatórios. O calote é o pior caminho que se poderia escolher. É injusto com os credores, tem impacto social e é nefasto para a economia. Assim, esperamos que a Câmara dos Deputados considere todos esses aspectos e suprima do texto da PEC Emergencial toda matéria referente aos precatórios, levando em conta que as medidas propostas irão ampliar o déficit público e o desemprego, aspectos econômicos de suma importância para o atual momento que o Brasil enfrenta.

*Marco Antonio Innocenti é sócio da Innocenti Advogados, presidente da Comissão de Estudos de Precatórios do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) e secretário-geral da Comissão de Precatórios da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)

Fonte: Blog do Fausto Macedo, Estadão

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