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As várias formas de solucionar a questão dos precatórios, por Innocenti

Só deixar de pagar é a pior saída; depósito em juízo é alternativa

MARCO ANTONIO INNOCENTI

Opagamento dos precatórios costuma figurar entre os primeiros ameaçados quando o governo da vez vê os cofres vazios. Não foi diferente na crise da pandemia. O presidente Jair Bolsonaro levantou a possibilidade de dar o calote nesses títulos e usar o dinheiro para financiar um programa social.

Recentemente, o ministro da Economia, Paulo Guedes, retomou o assunto. Segundo ele, a “indústria dos precatórios” vai “acabar com o país”. O STF suspendeu temporariamente os pagamentos de São Paulo por decisão monocrática do seu presidente.

No entanto, essas tentativas são completamente deletérias para as finanças públicas, ao contrário do que pensam alguns gestores públicos. Um estudo inédito da FGV (Fundação Getúlio Vargas) aponta que Estados e municípios devem R$ 104 bilhões em precatórios. Esses valores, no entanto, podem crescer exponencialmente a cada ano de protelação de pagamento, avaliam os pesquisadores.

Ora, o precatório nada mais é do que o título de uma dívida decorrente de uma ação que o Estado perdeu na Justiça. Portanto, não há mais o que discutir. A ação transitou em julgado, o Estado perdeu e tem que pagar, da mesma forma que um cidadão ou uma empresa que sejam condenados a indenizar a outra parte.

Quando não se paga o título na data prevista, incidem multas e juros de mora. Assim, conforme o tempo passa, a dívida vai aumentando, de forma que, no fim, o valor original representa apenas uma pequena parcela do que terá de ser pago.

Essa dinâmica não é nenhuma novidade. Se nós, cidadãos, não pagarmos uma conta de luz por 20 ou 30 anos, no fim, também teremos uma dívida enorme.

Do ponto de vista da gestão pública, a questão é a mesma, mas pode ser ampliada. O investidor pode pensar: se o governo não paga seus credores, o que garante que pagará aos seus financiadores? Isso dá a dimensão do que significa para a credibilidade o país suspender esses pagamentos.

Assim, é preciso esclarecer que o problema não é o precatório, mas a gestão dessa dívida.

A boa notícia é que existem diversas formas possíveis de gerenciar o pagamento de precatórios e, assim, honrar o compromisso com os credores, sem onerar excessivamente os cofres públicos.

O mesmo estudo da FGV analisa a viabilidade e o impacto de cada uma dessas possibilidades. Elas se mostram especialmente importantes para os Estados e municípios que não estão em dia com esses pagamentos e que –esses sim– veem a dívida com precatórios aumentar exponencialmente, estrangulando seus orçamentos.

Uma das opções para gerenciar essa dívida de forma mais racional seria ampliar o uso de depósitos judiciais para pagar os precatórios. Pessoas físicas ou jurídicas, envolvidas nos mais variados tipos de processos (com ou sem participação de qualquer ente público), realizam depósitos em juízo, o que garante à parte vencedora da ação o recebimento do valor, quando do trânsito em julgado. Esses recursos ficam retidos nas chamadas “contas de depósito judicial”, cuja administração é de responsabilidade do Poder Judiciário, ou seja, do poder público.

Não é raro que os depósitos judiciais fiquem retidos nessas contas por muitos anos, o que faz com que o volume de recursos sob administração estatal seja significativo. Conforme noticiado em agosto de 2019 pelo jornal Valor Econômico, estima-se que o volume total depositado em juízo seja de R$ 500 bilhões.

Esses recursos ficam depositados em instituições financeiras e são corrigidos seguindo a remuneração da poupança, que equivale a 70% da taxa Selic, ou seja, uma remuneração muito baixa. Os bancos usam esse dinheiro nas suas próprias operações, ganhando muito mais do que isso. Por isso, não seria errado dizer que valores sob responsabilidade do poder público ajudam a financiar instituições financeiras privadas.

Ao mesmo tempo, o governo se endivida a taxas superiores a essa. O estudo da FGV mostrou que um precatório emitido em dezembro de 1999 teria, em dezembro de 2019, valor 17% superior ao do depósito judicial. A diferença mostra o potencial de ganho econômico, caso os valores retidos a título de depósitos judiciais fossem utilizados para quitação de precatórios.

Assim, os depósitos judiciais poderiam ser uma fonte de recursos com baixo custo para o pagamento de uma dívida mais cara, como os precatórios. Essa alternativa, de acordo com os cálculos da FGV, poderia reduzir de 15% a 49% o valor desembolsado pelo ente público.

Outra opção seria ampliar a possibilidade de que Estados e municípios consigam tomar dívida lastreada em recursos da União. Atualmente, só a União pode emitir títulos de dívida. Por isso, os Estados e municípios precisam recorrer a instituições de mercado para se financiar, com taxas de juros superiores àquelas verificadas em títulos emitidos pelo governo federal.

Para o poder público como um todo, porém, seria mais eficiente que os precatórios fossem quitados por meio do endividamento da União, ou com seu aval, do que por meio de endividamento bancário. Esse tipo de solução, atrelado a um acordo claro entre municípios e Estados com a União, permitiria a redução do custo da dívida e a antecipação do recebimento por parte de credores.

Esse mecanismo oferece um duplo benefício. O primeiro é que as despesas com juros totais, somando-se União, Estados e municípios, seriam reduzidas; o segundo, promoveria um estímulo à economia por meio da injeção de recursos relativos à antecipação de precatórios que, de outra forma, demorariam mais a serem pagos.

Outra opção seria ampliar e organizar melhor as informações relativas aos precatórios em todo o país, considerando também Estados e municípios, ampliando a transparência e reduzindo a assimetria de informações. Essa alternativa apresenta diversas vantagens, como o próprio desenvolvimento da base de dados sobre negociações de precatórios, maior previsibilidade nos pagamentos, criação de mecanismos que mensurem a situação fiscal de Estados e municípios e maior homogeneidade de informação entre os ofertantes de precatórios e os investidores.

Isso seria benéfico ainda para desenvolver o mercado secundário desses títulos. Atualmente, além de ser muito restrito, ele opera com deságio muito grande, de até 83%, em relação ao valor de face do precatório, devido à baixa visibilidade que os investidores têm sobre o pagamento dos títulos.

Como se vê, existem diversas opções na mesa para gerenciar a dívida decorrente dos precatórios de forma mais eficiente. É preciso que o poder público faça a sua parte e busque soluções reais e não apenas suspenda os pagamentos, o que, no fim do dia, prejudica todas as partes: os cidadãos, que não recebem seus direitos, e o governo, que amplia as contas públicas que deveria proteger.

Fonte: Poder 360

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